sábado, 26 de março de 2011

Reforma tributária: a questão é redistribuir, mais que diminuir

Escrito por: Artur Henrique, presidente nacional CUT

Nos próximos dias 21 e 22, a CUT realiza um seminário internacional que vai abordar nossas propostas para uma reforma tributária realmente democrática e distributiva, e também para identificar quais os obstáculos, colocados pela correlação de forças na sociedade e no Congresso, para implementar as mudanças que defendemos.

O seminário Tributos e Desenvolvimento: Perspectivas para o Trabalho e a Distribuição de Renda será realizado em Brasília, com a participação de entidades sindicais a nós filiadas, acadêmicos e pesquisadores, parlamentares e lideranças sindicais de outros países onde, diferentemente do Brasil, a estrutura tributária é progressiva, priorizando a taxação sobre a renda e a propriedade em lugar de taxar o consumo. A taxação sobre o consumo, como dominante em nosso País, está na raiz dos nossos males tributários, pois faz com que os mais pobres paguem mais impostos, enquanto os mais ricos paguem menos.

Este é nosso principal desafio: mudar a estrutura regressiva de nossa estrutura tributária, concentradora de renda.

Não vamos repercutir o discurso fácil de que o objetivo único da reforma deve ser a diminuição pura e simples da carga tributária.

Esse é o discurso de parcela do empresariado que pensa apenas em como simplificar sua própria atividade, sem considerar o papel que deve ser cumprido pelos impostos para a manutenção dos serviços públicos, do acesso universal à saúde, educação, segurança e promoção da vida.

Nada de ilusão. O mercado, mais desregulado, não vai suprir as demandas sociais. Essa promessa já deu amplas provas de que é falsa.

Queremos apresentar alguns dados que desfazem a ideia alarmista de que a carga tributária cresce sem parar, sem guardar relação saudável com a atividade econômica, e que portanto precisaríamos a todo custo, em primeiro lugar, reduzir impostos.

Nossa visão é de que é preciso distribuir os resultados tributários de maneira mais justa para a maioria, antes de pensar em cortar. Nosso País acumula muitas desigualdades e há muito tempo, e a reforma tributária tem de dar conta disso.

Recorremos a um dado de artigo publicado semana passada pelo professor Amir Kahir, em que diz com todas as letras que a carga tributária não cresce desde 2005.

Sua tese é de que se a arrecadação não cresce mais que o PIB, não há aumento da carga tributária.

Acompanhe trecho do artigo de Amir:

“Desde 1970 até 1990 a CT oscilava muito pouco em torno de 25% do PIB. Em 1994, com o Plano Real, ela sofre forte aumento devido à queda abrupta da inflação, permitindo reduzir a perda inflacionária dos tributos (efeito Tanzi) e atinge 29%. Isso ocorre uma vez só. A partir de 2005 volta à sua tendência crescente que se iniciou em 1991, com crescimento anual de 0,72 ponto percentual do PIB até 2005. A partir de 2005 ela se estabilizou com ligeiras oscilações em torno de novo nível de 33% do PIB. O gráfico ilustra essa evolução.”


Peço agora licença para retomar algo que escrevi no ano passado, logo após acompanhar uma apresentação do então secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Machado, ao plenário do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES).

Acompanhe trechos:

“Um certo tipo de crítica que se faz à carga tributária brasileira esconde propósitos muito egoístas, apesar da aparência patriótica. É uma campanha que tem até painel eletrônico numa rua da capital paulista – o “impostômetro” de uma associação empresarial – e humorista de televisão se fingindo de frentista de posto para vender gasolina mais barata, “sem imposto”. Algo que os patrocinadores dessas ações querem de verdade, mas tentam ocultar, é a diminuição dos investimentos do Estado em programas sociais ou em políticas de transferência de renda como o Bolsa Família (...)

“Em 2002, último ano de FHC, o governo federal gastava 4,8% do PIB (Produto Interno Bruto) com pagamento de pessoal. Em março de 2010, depois da “gastança”, do “aparelhamento” e outras imprudências atribuídas ao governo Lula, a folha de pagamento dos servidores consome… 4,8% do PIB. Houve, sim, aumentos salariais e contratações, essenciais para o processo de recomposição do Estado, mas dentro de uma lógica de acompanhamento da arrecadação e do crescimento da economia. Aliás, esses investimentos também funcionam como motivadores do crescimento econômico.

Por outro lado, os programas de transferência de renda, que em 2002 correspondiam a 6,4% do PIB, em março de 2010 saltaram para 9,1% do PIB, o que representa algo em torno de R$ R$29,6 bilhões de reais. Assim, se a carga tributária fosse simplesmente reduzida, como bradam analistas e empresários, as políticas públicas e sociais estariam entre as mais fortemente atingidas (...)

A carga tributária está em torno de 34% do PIB. Mas não se trata de loucura sem paralelo no mundo civilizado, como querem fazer parecer muitos analistas por aí. Essa proporção está na mesma faixa de países como Portugal, Espanha, Inglaterra e Alemanha e muito, muito abaixo de nações com forte estrutura de bem estar social, como Suécia e Dinamarca. Sem os impostos, como investir no papel social do Estado, nas políticas públicas?

O debate correto seria discutir a qualidade dos gastos, as prioridades, o orçamento participativo, e outros instrumentos que garantam que o Estado esteja realmente a serviço da maioria da sociedade.

Para os trabalhadores e trabalhadoras, mais importante que a proporção dos impostos em relação ao PIB, é chamar a atenção para quem é mais penalizado. Segundo estudo do economista Amir Khair, famílias que ganham até 2 salários mínimos pagam quase 49% de sua renda mensal em impostos. Já os mais favorecidos, que ganham acima de 30 salários mínimos por mês, comprometem 26,3% de sua renda com impostos. Muito menos.

Então, o desafio é alterar essa lógica perversa e criar um modelo tributário progressivo: quem ganha mais, paga mais. Quem ganha menos, paga menos.”

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